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Pandemia e lixo infectado: desafios e medos dos trabalhadores de Araputanga-MT

Redução na produção de material reciclado, uso de máscara e colega infectado são algumas situações vividas por quem está trabalhando na pandemia 

Reportagem: Marcela Brito

No município de Araputanga, cidade no interior do Mato Grosso com mais de 16 mil habitantes, ao uniforme dos profissionais que trabalham com a coleta do lixo  - que já possuía luvas e botas - foi adicionado a máscara e o álcool em gel. Mesmo com o uso desses equipamentos, a insegurança e a dificuldade de adaptação fazem parte desse momento de pandemia. 

Em Araputanga, os profissionais contratados pela prefeitura são ligados à Associação Ambiental de Catadores Recicláveis. O local fica fora da cidade, cerca de três quilômetros da região central. Devido a distância, um dos três barracões da Associação possui uma cozinha que serve o almoço todos os dias. 

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Cozinha da Associação de Araputanga.

Foto: Marcela Brito. 

Em frente a cozinha, está a pilha de lixo eletrônico que será separado. Foto: Marcela Brito.

Cozinha da Associação de Araputanga.

Foto: Marcela Brito. 

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Entrada do primeiro barracão, parte aberta com os materiais separados e o fundo do barracão com a imagem dos três espaços. Ao fundo, está a baía com o material que não pode ser reciclado.

Foto: Marcela Brito.

No momento, a associação emprega 27 pessoas. O salário líquido dos associados e de alguns coletores é de R$1.045,00. Já os garis recebem R$1.250,00 e os motoristas conseguem tirar R$1.500,00 ao fim do mês. Os valores podem aumentar de acordo com os rendimentos mensais da Associação que lucra com a venda de materiais recicláveis, como o plástico, papelão e metal.

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Alguns membros da Associação Ambiental de Catadores Recicláveis do município de Araputanga.

Foto: arquivo pessoal.

No quadro de associados estão os motoristas, coletores do caminhão, operadores de prensa, separadores e garis que atuam no recolhimento do lixo das ruas até a reciclagem desses materiais. De acordo com Rosimeire Peres Crispim, de 35 anos, gerente de produção, hoje 22% (6) dos funcionários são mulheres. 

Ao número maior de homens na associação, Rosimeire atribui ao tipo de trabalho exercido na associação, que muitas vezes envolve força para o manejo de fardos de material reciclado, que podem pesar até 630 quilos. A idade dos associados vai dos 19 anos até os 60 anos de idade. Para as pessoas com idade mais avançada, a associação atribui atividades que exigem menos esforço físico.  

Rose ou mãezona, como é chamada pelos associados, conta que não consegue definir um perfil comum dos trabalhadores. “Já lidei com pessoas com problemas com álcool, dependentes químicos. Aqui todo tipo de pessoa tem oportunidade e já vi pessoas mudando de vida aqui dentro”, conta. 

A associação nasceu a partir de outro grupo, a Associação de Catadores Reciclar para Viver Melhor, da cidade de Reserva do Cabaçal - MT. Em 2019, após a morte de Claudemir Vanzella, fundador e presidente da primeira associação, o grupo decidiu criar outra associação e mudar para a cidade de Araputanga. 

Com quadro atual de 27 associados, o grupo chegou a ter 23 pessoas trabalhando ao longo dos nove meses de pandemia. Os afastamentos de funcionários se deram por atestados médicos e suspeitas de Covid-19 em alguns casos.

Nesse período também houve queda na produção de material reciclável. De acordo com Rosimeire, que trabalha há mais de três anos com a associação, as pessoas estão produzindo mais lixo, mas menos material reciclável. A queda afetou diretamente o trabalho da associação. 

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Rosimeire sobre a responsabilidade com a separação de materiais recicláveis. 

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Rosimeire conversando com estudantes da rede de ensino pública de Araputanga. 

Foto: acervo pessoal.

Com a queda na produção, não há o bônus salarial vindo das vendas de material reciclado. Além das mudanças na produção para os associados que trabalham na coleta ou reciclagem do lixo, a insegurança também fez parte da jornada.  

“Eu tinha medo de sair de casa, de sair pro barracão”

É dessa forma que Edivaldo Rocha da Silva, de 28 anos, descreve a experiência de trabalhar por alguns meses como corredor do caminhão de lixo, na coleta de resíduos. Associado há sete meses, Edivaldo é fumante e hoje trabalha na separação dos materiais eletrônicos no galpão da associação. 

Mesmo com a adoção da máscara e álcool em gel, ele não se sentia seguro. “Eu trabalhava na rua, mas era com medo por causa da pandemia. Ficava cismado de pegar no lixo porque não sabia o que tava ou não infectado”, conta.  

Um de seus grandes receios era contrair o coronavírus e passar a doença para o filho Eduardo, de 16 anos, que é deficiente e vive deitado. Ele faz parte do grupo de risco. Para o pai, se ele infectar o filho, existe o risco de Eduardo não conseguir superar a doença. 

O medo de infectar e perder familiares do grupo de risco também era partilhado por Felipe Matheus Ferreira, de 24 anos, estudante de Gestão em Tecnologia da Informação e que está há um ano e sete meses na associação. Ele trabalha na separação e prensa dos materiais. 

Felipe mora com um idoso de 64 anos. Antes de ir para casa, ele tomava banho na associação. Ao chegar do trabalho, ele colocava a roupa de molho na água sanitária. Ele conta que “deu aquele medo se vai acontecer com alguém aqui. Não tivemos o problema com todo mundo aqui de dentro, só teve o motorista que pegou da esposa, mas isso gerou muita insegurança”. 

Um dos momentos mais tensos nesse período foi quando uma colega de trabalho próxima a ele apresentou um “falso positivo”. 

 “Uma menina que trabalhava na gaiola, próximo a mim, começou a ter sintomas. Na semana seguinte, ela entrou de quarentena. Como eu estava próximo, fiquei pensando nisso porque moro com um idoso. Graças a Deus, era só um falso positivo”, conta. 

Diferentemente de outras cidades onde moradores se mobilizaram para sinalizar o lixo infectado, em Araputanga essa ação não aconteceu. Rosimeire conta que avisou o responsável pela Vigilância Sanitária da cidade, porém ela acredita que não fizeram. “Não tinha como saber que a casa estava em isolamento, mas dentro da sua casa quem determina é a própria pessoa”, afirma. 

 

Um dos momentos mais tensos para Edivaldo e o motorista Dermeval Rocha da Silva, de 32 anos, foi quando quase recolheram um material infectado no centro de reabilitação de pacientes com Covid-19. “Fomos pegar um material lá e tinha um saco separado com material infectado. A gente não sabia e quase o pegamos. Quando a mulher falou que era o outro, eu nem cheguei perto, o outro rapaz que pegou”, conta Edivaldo.  

Dos funcionários da associação, apenas o motorista Claudezino José da Silva Júnior foi diagnosticado com Covid-19. Ele já se recuperou e está no período de férias. De acordo com último boletim divulgado em 27 de novembro pela Secretaria Municipal de Saúde de Araputanga, a cidade registrou até aquela data 588 casos da doença. Há também sete óbitos, 20 casos aguardando resultados de exames e 841 diagnósticos negativos para infecção do vírus.  

“Se não usar máscara, leva carcada”

É dessa forma que Dermeval brinca e conta sobre o uso obrigatório de máscara no trabalho, prática cobrada no ambiente de trabalho. Entretanto, ele relembra que alguns colegas já esqueceram de usar máscara. “Às vezes alguém pegava no lixo e depois ia enrolar o cigarro sem passar o álcool em gel. Isso porque ainda não tinha o costume”, conta.

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Placa com aviso para uso obrigatório de máscara na associação. 

Foto: Marcela Brito.

De acordo com Felipe e Edivaldo, em alguns momentos a máscara dificultou o trabalho. Edivaldo, que trabalhava na coleta de lixo na cidade e precisava correr, conta que ficava cansado com a máscara no rosto. Ele relata que “a gente corria e cansava, ia pegar um material e cansava. Às vezes tinha que tirar a máscara porque era cansativo para nós”. 

Já Felipe, que trabalha na primeira linha de separação dos materiais, sente que a força diminuiu um pouco com a máscara. Em atividades que exigiam mais força, como empurrar os fardos dos materiais, segundo ele, a máscara reduziu seu desempenho. 

Além da máscara e álcool em gel, alguns associados utilizaram a auto-hemoterapia como forma de prevenção. Esse procedimento ocorre da seguinte forma: é colhido uma quantidade de sangue e esse material é reinjetado na mesma pessoa, numa transfusão intramuscular. 

De acordo com Hildenete Fortes, presidente do Conselho Regional de Medicina do estado Mato Grosso e responsável pela Agência Transfusional do Hospital Universitário Júlio Müller, essa prática não é reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina (CRM) e pela Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH). 

A auto-hemoterapia já foi utilizada no tratamento de artrite, reumatismo e psoríase, porém não há comprovação científica de sua eficácia. Também não existe a validação dessa prática na prevenção e tratamento de Covid-19. 

A presidente do Conselho afirma que não conhece estudos brasileiros sobre a auto-hemoterapia e alerta que “médicos que praticam a auto-hemoterapia estão infringindo o código de ética médica”.  

Quando a pandemia acabar...

Entre os profissionais que já atuaram como gari, vários planos já foram traçados para quando a pandemia acabar. José da Silva, de 42 anos, que hoje trabalha na primeira linha de separação, quer viajar, ir à praia e visitar seus colegas. Ele conta que está construindo uma área de lazer na sua casa e que, após a pandemia, vai convidar seus colegas para fazer um churrasco em comemoração. 

Edivaldo conta que sente saudades de ir para a casa dos amigos e da chefe Rosimeire, para tomar tereré, bebida gelada feita com a infusão de erva-mate em água fria. Após a pandemia, quer levar a esposa para passear, tomar banho de rio e “assar uma carninha com meus amigos”. Jair Teixeira, de 60 anos, trabalha como zelador do pátio da Associação, conta que tem saudades de sair com os amigos e que só sai de casa para trabalhar, ir ao mercado e à farmácia. 

Após o fim da pandemia, ele quer “passear, ir para o lago azul, me divertir no meio do povão; porque enquanto tiver pandemia não tem jeito”. No fim, o desejo de seu Jair é semelhante ao de outros colegas de trabalho: “voltar ao normal, como era antes da pandemia. É isso que a gente quer!”. 

Conheça também a situação dos trabalhadores durante a pandemia em outras partes do país. Confira a reportagem de Recife, no estado de Pernambuco. 

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