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“Se a gente não arregaçar as mangas e lutar, as cooperativas fecham!”

Catadora e presidente de cooperativa critica a gestão do lixo durante a pandemia em Campinas - SP

Reportagem: Celina Silveira

Com mais de 1 milhão de habitantes e o décimo primeiro PIB mais alto do país, segundo dados do IBGE, em 2019, Campinas também é o maior município do interior do estado de São Paulo. Na cidade, as doze cooperativas de reciclagem que atendiam a população até o primeiro semestre de 2020 precisaram pausar as atividades quando, em 19 de março, a prefeitura decretou situação de emergência por conta do enfrentamento da pandemia do novo coronavírus (Sars-Cov-2).

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A paralisação durou cerca de seis meses e mais de 250 pessoas ficaram sem renda fixa no período. Para tentar amenizar as dificuldades que os catadores de materiais recicláveis viriam a enfrentar durante a paralisação, ainda em março, a procuradora Marcela Dória do Ministério Público do Trabalho de Campinas recomendou, por meio de documento enviado à Prefeitura, que a Administração mantivesse a remuneração para os catadores com contratos de trabalho vigentes nos últimos 12 meses. Para os não contratados e os autônomos, solicitou que a Prefeitura garantisse remuneração não inferior a meio salário mínimo.

 

Em maio, após negociação com o MPT, a Prefeitura de Campinas anunciou o pagamento do valor equivalente a dois meses de serviços para as cooperativas Antonio da Costa Santos e Nossa Senhora Aparecida, únicas com contrato regularizado e em vigência com a Secretaria Municipal de Serviços Públicos. Os demais catadores, segundo o acordo, recebem mensalmente a contribuição de R$90 por meio do Cartão Nutrir, programa de segurança alimentar ligado à Secretaria de Assistência Social.

 

No dia 21 de setembro, o retorno das atividades das cooperativas foi autorizado com redução no número de trabalhadores e aplicação de medidas de prevenção, como uso de EPIs e higienização frequente dos locais. A categoria reclama que todo o lixo produzido nos seis meses de paralisação foi encaminhado para o aterro municipal de Paulínia, cidade localizada a cerca de 27 km de Campinas. O desejo dos catadores era que o lixo fosse encaminhado para um depósito do município ou para armazenamento nas próprias cooperativas até que o retorno ao trabalho fosse autorizado para os catadores de materiais recicláveis.

 

Um levantamento feito pelo Departamento de Limpeza Urbana de Campinas indica que 850 toneladas de lixo residencial são coletadas na cidade todos os meses. A média de material reciclado recolhido mensalmente é de 510 toneladas. Os dados apontam que, no período de seis meses de paralisação, 3.060 toneladas de recicláveis deixaram de virar renda para catadores e foram encaminhadas ao aterro de Paulínia-SP.

 

Solange Regina Alarcon Teixeira, 44, é catadora de materiais reutilizáveis e presidente da Cooperativa Aliança, que gera emprego para outros 24 catadores. Segundo ela, a cooperativa tem capacidade para o dobro de cooperados, no entanto, o material disponível para o trabalho não é suficiente.  Antes da pandemia, conta Solange, os cooperados da Aliança chegaram a passar até três dias sem ter o que separar. “Falta coleta seletiva, falta educação ambiental e a gente precisa de ajuda do poder público, tem que ser de interesse deles também que as cooperativas caminhem bem. A gente vê que precisa educação ambiental, principalmente nas escolas e depois as crianças ensinam seus pais e cobram seus pais, mas a gente não vê isso, só vemos falta de material.”

 

Solange explica que o retorno da coleta seletiva é importante para que as famílias voltem a ter uma fonte de renda, mas, também, para que o material reciclável, encaminhado durante os primeiros seis meses de pandemia para o aterro sanitário de Paulínia e misturado ao lixo orgânico, seja novamente tratado de maneira sustentável. “Às vezes a gente fica até triste de não reconhecerem o trabalho da gente. A cooperativa já quase fechou várias vezes, é luta em cima de luta. Se a gente não arregaçar as mangas e lutar, as cooperativas fecham”, conclui Solange.

Conheça também a situação dos trabalhadores durante a pandemia em outras partes do país. Confira a reportagem de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro.

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